“Eu sei que fui vítima da maior mentira jurídica contada em 500 anos de História”, disse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta quarta-feira (10), dois dias depois de o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), ter anulado as condenações do petista na Lava Jatopor entender que a 13ª Vara de Curitiba não tinha competência para analisar os casos.
“Antes de eu ir [para a prisão], nós tínhamos escrito um livro, e eu fui a pessoa, dei a palavra final no título do livro, que é ‘A verdade vencerá’. Eu tinha tanta confiança e tanta consciência do que estava acontecendo no Brasil, que eu tinha certeza que esse dia chegaria, e ele chegou”, afirmou Lula no Sindicato dos Metalúrgicos, em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo.
Durante o discurso de uma hora e 23 minutos de duração, o ex-presidente também relacionou seu caso ao sofrimento da população mais pobre durante a pandemia de Covid-19:
“Se tem um brasileiro que tem razão de ter muitas e profundas mágoas sou eu, mas não tenho. Sinceramente, eu não tenho. Porque o sofrimento que o povo brasileiro está passando, o sofrimento que as pessoas pobres estão passando neste país é infinitamente maior do que qualquer crime que cometeram contra mim”.
Lula durante pronunciamento na sede do Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo, no ABC, nesta quarta-feira (10) — Foto: Andre Penner/AP
Lula durante pronunciamento na sede do Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo, no ABC, nesta quarta-feira (10) — Foto: Andre Penner/AP
Nesta segunda-feira (8), Fachin anulou todas as condenações do ex-presidente pela Justiça Federal no Paraná relacionadas à Operação Lava Jato. Com a decisão, Lula recuperou os direitos políticos e voltou a ser elegível.
O ministro do STF aceitou o argumento da defesa do ex-presidente de que essas denúncias não estariam diretamente ligadas a desvios na Petrobras e determinou o envio dos processos à Justiça Federal do Distrito Federal.
Lula agradeceu a Fachin e disse que a decisão do ministro reconheceu que nunca houve crime cometido contra ele ou envolvimento dele com a Petrobras. No entanto, a decisão do ministro foi apenas processual: ele avaliou quem tinha competência para analisar o tipo de denúncia proposta. Fachin não analisou se Lula é culpado ou inocente.
“O processo vai continuar, tudo bem, eu já fui absolvido de todos os processos fora de Curitiba, mas nós vamos continuar brigando para que o Moro seja considerado suspeito, porque ele não tem o direito de se transformar no maior mentiroso da história do Brasil e ser considerado herói por aqueles que queriam me culpar. Deus de barro não dura muito tempo.”
Na decisão de segunda, o ministro Edson Fachin extinguiu 14 processos que questionavam se o então juiz Sergio Moro agiu com parcialidade ao condenar Lula. A Segunda Turma do Supremo voltou a analisar essa questão nesta terça-feira (9), mas ainda não concluiu.
O ex-presidente Lula chamou a força-tarefa da Lava Jato de “quadrilha” e disse que ela tinha uma obsessão por condená-lo porque queria criar um partido político. O petista afirmou que a operação “desapareceu” da sua vida.
“Hoje, eu tenho certeza que ele [Moro] deve estar sofrendo muito mais do que eu sofri. Eu tenho certeza que o Dallagnol deve estar sofrendo muito mais do que eu sofri, porque eles sabem que eles [Moro e Dallagnol] cometeram um erro, e eu sabia que eu não tinha cometido um erro”, afirmou o ex-presidente.
Procurados pelo G1, Sergio Moro e o Ministério Público Federal no Paraná afirmaram que não vão comentar o discurso de Lula.
Defesa de vacina e críticas a Bolsonaro
Lula, que estava de máscara no evento, retirou a proteção para discursar. Ele disse que fez isso após consultar um médico e por estar a mais de 2 metros de distância de outras pessoas.
O ex-presidente prestou solidariedade às famílias que perderam pessoas para a Covid-19 e aos que estão desempregados.
Lula chamou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de “fanfarrão” e criticou a forma como ele está conduzindo o país.
Afirmou que o Brasil “não tem governo”, que a população precisa de emprego, e não de armas, e defendeu a vacinação e as medidas de isolamento social. Bolsonaro tem adotado medidas para facilitar o acesso a armas, é um crítico das restrições de circulação e resistiu a comprar vacinas contra o coronavírus.
“Eu vou tomar minha vacina e quero fazer propaganda para o povo brasileiro: não siga nenhuma decisão imbecil do presidente da República ou do ministro da Saúde. Tome vacina. Tome vacina, porque a vacina é uma das coisas que pode livrar você do Covid. Mas, mesmo tomando vacina, não ache que você possa tomar a vacina e já tirar a camisa, ir para o boteco, pedir uma cerveja gelada e ficar conversando, não! Você precisa continuar fazendo o isolamento, e você precisa continuar usando máscara e utilizando álcool em gel.”
Lula defendeu o Auxílio Emergencial – medida proposta pelo governo Bolsonaro e ampliada pelo Congresso para compensar a perda de renda durante a pandemia – e criticou a paridade de preços dos combustíveis do Brasil com o mercado internacional.
Bolsonaro tem reclamado dos reajustes aplicados pela Petrobras e interferiu na companhia ao indicar um novo presidente.
O ex-presidente também disse que quer dialogar com empresários e criticou o ministro da Economia, Paulo Guedes. “Você já viu o Guedes falar uma palavra de desenvolvimento econômico e distribuição de renda? Não, é vender… Agora, quando eles venderem e gastam o dinheiro em custeio, o país vai estar mais pobre. O PIB não vai crescer e a dívida vai continuar crescendo. […] O que vai fazer nossa dívida diminuir em relação ao PIB é o crescimento econômico, é o investimento público. […] Se não Estado não confia na sua política e não investe, por que o empresário haveria de investir?”.
O ex-presidente afirmou ainda que, em 2008, a indústria automobilística vendia 4 milhões de carros por ano. Passados 13 anos, vende 2 milhões, porque “não há possibilidade de investimento se não houver demanda, para ter demanda tem que ter emprego”.
Imprensa
Durante o discurso, o ex-presidente defendeu a liberdade de imprensa, disse que ela é uma das razões principais para a manutenção da democracia, e fez críticas à cobertura da Operação Lava Jato.
“Eu fiquei muito feliz porque depois da divulgação de tanta mentira contra mim, ontem eu acho que nós tivemos um Jornal Nacional épico. Eu acho que quem assistiu televisão não estava acreditando no que estava vendo. Pela primeira vez, a verdade prevaleceu”.
G1