O deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) afirmou nesta sexta-feira à CPI da Covid que o presidente Jair Bolsonaro citou nominalmente o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), ao ouvir denúncias de irregularidades na compra da vacina Covaxin.
A conversa entre Bolsonaro e Miranda aconteceu em 20 de março no Palácio da Alvorada, de acordo com o parlamentar. Ao narrar o encontro à CPI, inicialmente, o deputado omitiu o nome de Ricardo Barros.
“O presidente entendeu a gravidade. Olhando nos meus olhos, ele falou: ‘Isso é grave’. Não me recordo do nome do parlamentar, mas ele até citou um nome para mim, dizendo: ‘Isso é coisa de fulano’. E falou: ‘Vou acionar o diretor-geral da Polícia Federal, porque, de fato, Luis, isso é muito grave”, disse o deputado nesta sexta.
“Ele diz: ‘isso é coisa do fulano. [Palavrão], mais uma vez’. E dá um tapa na mesa”, relatou Miranda em outro momento.
Em transmissão nesta quinta (24), o presidente Jair Bolsonaro confirmou ter se reunido com Luis Miranda, mas disse que o parlamentar não relatou suspeitas de corrupção na compra da Covaxin.
O deputado fez a primeira menção à suposta frase de Bolsonaro às 15h35. A partir daí, questionado várias vezes, Miranda resistiu em informar quem seria o “fulano” – dizia não lembrar. Somente às 21h48 admitiu, ao responder a um questionamento da senadora Simone Tebet (MDB-MS) e depois de ter sido pressionado por vários senadores.
“Eu sei o que vai acontecer comigo. A senhora [Simone Tebet] também sabe que é o Ricardo Barros que o presidente falou”, afirmou Luis Miranda.
Simone Tebet insistiu: “O senhor confirma?”
“Foi o Ricardo Barros que o presidente falou. Foi o Ricardo Barros”, repetiu Miranda.
Em uma rede social, no fim da noite, Ricardo Barros negou ter sido citado por Bolsonaro. O deputado disse que não participou de negociações sobre a compra da Covaxin e que não tem relação com “esses fatos”.
“Não participei de nenhuma negociação em relação à compra das vacinas Covaxin. ‘Não sou esse parlamentar citado’, A investigação provará isso. Também não é verdade que eu tenha indicado a servidora Regina Célia como informou o senador Randolfe. Não tenho relação com esse fatos”, postou Barros.
A servidora Regina Célia Silveira Oliveira, que aparece na mensagem de Barros, foi citada por Luis Ricardo Miranda – irmão do deputado – como a pessoa que deu aval ao avanço da papelada da Covaxin enquanto a área de importação apontava problemas.
Segundo o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Regina Célia assumiu o cargo quando Ricardo Barros era ministro da Saúde. O senador defendeu que a servidora seja convocada pela comissão.
Os irmãos Miranda foram convidados a depor à CPI após terem denunciado irregularidades no contrato da vacina indiana Covaxin e “pressão atípica” para a liberação do imunizante.
Luis Ricardo é chefe de importação do Departamento de Logística em Saúde do Ministério da Saúde. Ele já relatou o episódio ao Ministério Público Federal, que vê indícios de crime no processo.
Após a confirmação feita por Luis Miranda, senadores passaram a defender a convocação do líder do governo na Câmara dos Deputados, para prestar depoimento à CPI.
‘Já perdi tudo o que tenho’
O deputado Luis Miranda decidiu revelar o nome de Ricardo Barros após Simone Tebet afirmar que ele seria preservado em um eventual processo de Conselho de Ética – Miranda disse que estava sendo ameaçado e temia uma ação por quebra de decoro como retaliação.
“Se Vossa Excelência tiver a coragem de dizer o nome, não se preocupe com Conselho de Ética, porque nenhum deputado vai ter coragem de se insurgir contra Vossa Excelência, contra a opinião pública, contra a massa de brasileiros que quer saber a verdade. Pode falar o nome”, disse Tebet.
“A senhora sabe que se eu fizer isso eu vou ser perseguido. Já disseram que eu vou perder a relatoria da reforma tributária, já perdi todos os espaços, já perdi tudo o que eu tenho, já acabaram com a minha política. O que mais vocês querem que eu faça?”, afirmou Miranda.
Às lágrimas, no entanto, ele acabou cedendo: “Eu sei o que vai acontecer comigo. A senhora também sabe que é o Ricardo Barros”. “Eu queria ter dito desde o primeiro momento, mas é que vocês não sabem pelo o que eu vou passar”, afirmou.
Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, comemorou a confirmação feita por Luis Miranda. O senador alagoano disse que Ricardo Barros foi o autor de uma emenda a um projeto de lei que tinha o objetivo de permitir a compra da vacina indiana Covaxin.
“A senhora [Simone Tebet] acabou de nos proporcionar, a essa CPI, um grande momento. E eu queria aproveitar este momento para cumprimentá-la mais uma vez, para dizer que o nome citado pelo deputado Luis Miranda é o mesmo nome que apresentou na Câmara dos Deputados uma emenda, incluída na lei, que autorizou a aquisição da vacina indiana sem autorização da Anvisa”, afirmou o relator.
Série de perguntas
Enquanto Luis Miranda se negava a confirmar a identidade do deputado citado por Bolsonaro, senadores já citavam o nome de Ricardo Barros – líder do governo na Câmara e ex-ministro da Saúde.
Presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM) perguntou se o deputado citado por Bolsonaro compunha a base do governo. Miranda disse “ter certeza que sim”.
“Eu estou perguntando aqui se ele faz parte da base ou continua na base, porque ele [o presidente] gosta de fazer isso em live, acusar as pessoas de graça, chama todo mundo de corrupto e continua na base. Vossa Excelência, pelo Brasil, tem obrigação de dizer quem é esse deputado, que continua na base e continua usurpando”, disse Aziz.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE), “refrescando a memória” de Luis Miranda, perguntou se ele poderia confirmar se o nome citado por Bolsonaro era o de Ricardo Barros. “Ele foi ministro e exerce influência dentro do Ministério da Saúde”, disse Carvalho.
O deputado, porém, voltou a dizer que não sabia.
“Ter dúvidas, suspeitas, achar aqui nesse Parlamento é um risco. Queria ter essa certeza hoje, agora”, afirmou.
“Se eu tivesse como lhe precisar esse cara aqui que está por trás, que deixou de salvar 20 milhões de vidas porque apostou em outra vacina… Me perdoe não ter essa resposta agora, mas vou continuar fazendo o que é certo”, prosseguiu.
Mais incisivo, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) citou nominalmente Ricardo Barros e afirmou a Luis Miranda que, sem confirmar o nome, o esforço do deputado para “reconstruir uma imagem, de apresentar novamente para os brasileiros essa veia combativa, combate ao corrupção” seria em vão.
“Eu sou obrigado a dizer para vossa Excelência que esse esforço está sendo em vão. Está sendo em vão porque o senhor não está tendo a coragem de falar o nome Ricardo Barros. Claramente, está lhe faltando coragem para falar o nome do deputado federal Ricardo Barros, que é a figura que é referida em todos os corredores, com envolvimento nesses casos.”
Onyx defendeu Barros na quarta-feira
O nome de Ricardo Barros chegou a ser citado indiretamente pelo ministro Onyx Lorenzoni no pronunciamento que fez no Palácio do Planalto, na quarta-feira (23), após as primeiras declarações públicas dos irmãos Miranda sobre o caso.
Na ocasião, Onyx defendeu “o líder do governo” da acusação de que uma emenda sugerida por ele, e incluída em uma medida provisória aprovada na Câmara, teria facilitado a importação da Covaxin.
Essa emenda incluiu a autoridade sanitária da Índia – Central Drugs Standard Control Organization (CDSCO) – na lista de entidades que serviriam de parâmetro para que uma nova vacina fosse usada no Brasil, mesmo sem aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O deputado também apresentou um projeto de decreto legislativo para derrubar a exigência da realização da fase 3 de ensaios clínicos no país como condição para autorização emergencial de vacinas – o que também ajudaria o imunizante indiano.
“Dentre as mentiras assacadas hoje, foi uma contra o líder do governo, na votação da MP que se transformou na lei 14.124. É verdadeiro o fato que o líder do governo apresentou uma emenda ao Artigo 16. Da mesma forma que o senhor Renildo Calheiros apresentou a mesma emenda, do PCdoB. A mesma emenda foi apresentada também pelo senhor Orlando Silva, do PCdoB de São Paulo. Então, a insinuação fica no campo daquilo que abri essa apresentação, da pura maldade”, disse Onyx