A partir deste sábado (11), entram em vigor novas regras para o ingresso de viajantes no Brasil. Quem chegar em voos internacionais e não estiver imunizado contra a Covid-19 terá de apresentar o teste da doença, realizado até 72 horas antes do embarque, e cumprir quarentena de cinco dias. Na fronteira terrestre, será exigido comprovante de vacinação ou teste negativo.
As normas constam de portaria publicada na quinta-feira (9) no Diário Oficial da União, assinada pelos ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Marcelo Queiroga (Saúde), Anderson Torres (Justiça) e Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura).
A atualização se dá em meio ao surgimento da ômicron, variante classificada como de preocupação pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
Havia expectativa de que o governo pudesse considerar a recomendação da Anvisa de barrar viajantes que estiveram nos últimos 14 dias em Angola, Maláui, Moçambique e Zâmbia, o que não ocorreu desta vez. Devido ao avanço da nova variante no continente, já estão proibidos voos de seis países.
As novas regras para o transporte aéreo de passageiros seguem recomendações apresentadas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em 12 de novembro.
Membros do governo dizem que a nova portaria não estava acertada no momento do anúncio à imprensa, na última terça (7). Havia dúvidas sobre como pôr no papel as medidas sem deixar soar que o governo cobraria um “passaporte da vacina”, termo proibido no vocabulário bolsonarista.
Na leitura de técnicos do governo, o Planalto fez um esforço para mudar as regras e evitar responder por omissão na Justiça ou TCU (Tribunal de Contas da União), mas controlando os danos às bandeiras negacionistas Bolsonaro.
Fiscalização
Autoridades que acompanharam a discussão ainda têm dúvida sobre como será feita a fiscalização das quarentenas. Eles lembram que o Ministério da Saúde nem sequer conseguiu pôr de pé uma estratégia nacional de testagem.
Pela nova regra, a ideia é que os viajantes de voos internacionais sigam preenchendo um formulário exigido pela Anvisa, chamado DSV (Declaração de Saúde do Viajante), antes do embarque.
Neste documento, devem indicar em que local vão passar a quarentena no Brasil, caso não estejam vacinados, e assumir compromisso de bancar as despesas no período de isolamento —quem apresentar certificado de imunização estará liberado do período de isolamento.
Caso o viajante teste positivo ao final do período de quarentena, deverá continuar no isolamento, seguindo regras da Saúde.
Além disso, fiscais nos aeroportos brasileiros devem conferir os certificados de imunização daqueles que declararam ter recebido a vacina.
Descumprir as regras sanitárias pode levar estrangeiros a serem deportados. Já os brasileiros podem responder a ações civil, administrativa e penal.
Ainda que as regras para voos sejam mais brandas do que as de países que barram não vacinados, técnicos da Anvisa consideram um avanço cobrar o certificado ou quarentena nos aeroportos.
A agência sugere desde o fim de 2020 que viajantes façam quarentena. No começo, a recomendação era de isolamento de 14 dias, mas técnicos consideram razoável cinco dias. Isso porque só seria liberado quem apresentasse o exame negativo no fim deste período.
A agência ainda quer afastar o turismo antivacina.
As regras sobre as fronteiras terrestres não são consideradas ideais pela Anvisa, que pedia a cobrança do certificado de vacinação ou, como plano B, uma abertura pontual das divisas com países mais vacinados.
A discussão sobre mudança no controle das fronteiras começou a partir da vontade de Bolsonaro de reabrir os limites terrestres, sem cobrar a vacinação.
O Planalto cobrou uma manifestação da Anvisa. A agência propôs, em 12 de novembro, regras mais rígidas, barrando os não imunizados, como mostrou a Folha. Mesmo sem ser questionada, a agência também sugeriu que o governo passasse a cobrar a vacina nos aeroportos, ou exigisse quarentena de cinco dias.
Para evitar desagradar Bolsonaro e seus apoiadores, o Planalto ignorou por quase um mês as propostas da agência. Parte dos auxiliares do presidente apostava em esperar uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).
Pressão
Mas a pressão sobre o governo cresceu e ministros passaram a considerar inevitável endurecer o controle das fronteiras. Isso porque, além da Anvisa, TCU, DPU (Defensoria Pública da União) e Fiocruz pediram a cobrança do certificado de imunização de viajantes.
Na segunda (6), o ministro Luís Barroso, do STF, deu 48 horas para o Planalto se manifestar sobre o pedido da Anvisa.
Com todas as cobranças somadas, técnicos do governo passaram a temer ações administrativas ou na Justiça por omissão.
Representantes do Ministério da Saúde passaram a tentar convencer os interlocutores de Bolsonaro de que é vantajoso pedir o comprovante de vacinação. Um dos argumentos apresentado em reuniões interministeriais é que as restrições de entrada no Brasil por terra ficariam menos duras ao liberar quem está imunizado.
Hoje essas fronteiras estão praticamente fechadas, ou seja, um cenário ainda mais restritivo do que o proposto pela Anvisa. Essa ala do governo também afirmava que o Brasil poderia sofrer restrições de outros países caso mantivesse as fronteiras e aeroportos desprotegidos.
Em reunião na terça (7), ministros disseram a Bolsonaro que a decisão não era apenas política, pois havia aumentado a pressão e o risco de o governo ser responsabilizado por omissão.
Prefeitos e governadores também cobraram controle mais rígido das fronteiras. O governador João Doria (PSDB) disse que o “passaporte” será adotado no território paulista, caso o governo Bolsonaro não cobre o certificado de vacinação até 15 de dezembro.
O acordo no governo para aceitar parte da sugestão da Anvisa foi tentar afastar Bolsonaro da decisão e ainda reforçar que a mudança não impõe um passaporte da vacina.
No anúncio à imprensa, além de fazer críticas ao passaporte, Queiroga repetiu ideias negacionistas de Bolsonaro. “Essa questão da vacinação tem dado certo porque respeitamos as liberdades individuais. O presidente falou há pouco: às vezes é melhor perder a vida do que perder a liberdade”, disse o ministro.
Bolsonaro também voltou a reforçar o discurso de que o governo rejeita o “passaporte”, ainda que a ideia seja criar regras distintas aos não imunizados. “Não fechei nenhum botequim. E jamais vou exigir passaporte da vacina de vocês”, disse o presidente a apoiadores nesta quarta (8).
Com Folha de São Paulo