Ministra Rosa Weber vota pela inconstitucionalidade do orçamento secreto


Pelo voto da ministra fica vedada utilização de emendas para criação ou ampliação de despesas. Julgamento continua nesta quinta

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela inconstitucionalidade das emendas de relator. Estas emendas são conhecidas como orçamento secreto. Pelo voto da ministra, as emendas de relator devem se destinar exclusivamente à correção de erros e omissões dos projetos de lei relativos ao plano plurianual, às diretrizes orçamentárias, ao orçamento anual e aos créditos adicionais. Pelo voto da ministra fica vedada a utilização indevida das emendas para a criação de novas despesas ou de ampliação das programações previstas no projeto de lei orçamentária anual. Leia a íntegra do voto de Rosa Weber no julgamento do orçamento secreto.

Weber também determinou que caberá aos ministros de Estado titulares das pastas beneficiadas pelas emendas do relator a orientarem a execução dos valores em conformidade com os programas e projetos existentes nas áreas, afastando o caráter vinculante das indicações formuladas pelo relator geral do orçamento. Assim, na prática, pelo voto da ministra, ela devolve a discricionariedade do uso das emendas ao Executivo e reduz a margem de uso das emendas do relator pelos chefes do Legislativo Nacional.

A ministra também determinou que todas as unidades da Administração Pública que realizaram o empenho, liquidação e pagamento de despesas por emendas do relator entre 2020 e 2022, publiquem os dados referentes aos serviços, obras e compras realizadas com tal verbas.

A leitura do voto da ministra Rosa Weber durou toda a sessão desta quarta-feira (14/12) e ela foi enfática e incisiva contra as emendas do relator. De certa forma, a postura de Weber frustra as expectativas que alguns parlamentares tinham de um voto intermediário. Membros do Congresso Nacional vinham afirmando que estavam mantendo a interlocução com a relatora, no entanto, pelo voto, Rosa Weber deixou claro que não é afeita a conversas com a política.

O julgamento continua nesta quinta-feira (15/12) e o voto da relatora deve nortear a posição da maioria dos ministros. Mesmo em eventual pedido de vista, os ministros a favor da posição de Rosa Weber devem adiantar os seus votos. Além disso, em caso de vista, Weber pode dar uma liminar com os mesmos termos do voto proferido na sessão desta quarta-feira.

A discussão ocorre nas ADPFs 850, 851, 854 e 1.014.

Emendas do relator: um sistema recoberto por um manto de névoas
Durante a leitura de seu voto, a ministra Rosa Weber afirmou que a distribuição da emenda dos relatores tem “caráter obscuro”. Weber criticou a falta de transparência das emendas do relator, mesmo após a liminar referendada pelo plenário do Supremo. Para ela, as medidas tomadas pelo Congresso foram insuficientes para melhorar a transparência. Ela lembrou que na Câmara dos Deputados apenas 70% dos deputados prestou as contas devidas sobre os gastos com as emendas do relator, assim, 30% omitiram as informações. No Senado, o índice foi de 85%. Para Rosa Weber, as informações prestadas não satisfazem critério mínimos de exatidão e confiabilidade.

De acordo com a ministra, sozinho, o relator, no caso, o presidente da Câmara, teve cerca de R$ 20 bilhões em recursos, valor maior que o destinado às emendas individuais e de bancadas, juntos. A relatora ressaltou que o “alto grau de personalismo” das emendas do relator representa “prejuízo à efetividade das políticas públicas”.

“Não se sabe quem são os parlamentares, as quantias e não existem critérios objetivos para realização das despesas, tampouco observam regras de transparência. Nem mesmo o Congresso e o Ministério da Economia foram capazes de identificar nestes autos, os ordenadores das despesas registradas sob o classificador RP9, ou os critérios, ou obras, serviços e bens ou objetivos vinculados ao planejamento orçamentário alcançados sobre esses recursos”, afirmou.

A ministra lembrou de diversos escândalos envolvendo o orçamento e as emendas como o caso que ficou conhecido como Anões do Orçamento, em que políticos manipulavam emendas parlamentares com o objetivo de desviarem o dinheiro através de entidades sociais fantasmas ou com a ajuda de empreiteiras. E, em sua visão, as emendas do relator, mantém a obscuridade do uso do dinheiro público, prejudicando a moralidade, a impessoalidade e transparência necessárias à Administração Pública.

“As emendas do relator foram consignadas no orçamento da União em favor de um grupo restrito e incógnito de parlamentares, encobertos pelo véu da rubrica RP-9. Apenas o relator figura no plano formal como ordenador das despesas, enquanto os verdadeiros autores das indicações preservam o anonimato”, disse a ministra. “Não apenas a identidade dos efetivos solicitadores, mas também o próprio destino desses recursos acha-se recoberto por um manto de névoas. Isso porque não há efetiva programação orçamentária. As dotações consignam elevadas quantias vinculadas a finalidades genéricas vagas e ambíguas. Somente no momento do empenho, às vésperas da liquidação e do pagamento, torna-se possível identificar quem será o beneficiário dos recursos e o objeto das despesas”, acrescentou.

Para Rosa Weber, as emendas de relator são um verdadeiro orçamento secreto, pois não se sabe quem são os parlamentares integrantes do “grupo privilegiado”, não se conhecem as quantias administradas individualmente, não existem critérios objetivos e claros para a realização das despesas e tampouco observam-se regras de transparência na sua execução.

Regulamentação das emendas no Senado
A sessão começou com a relatora, ministra Rosa Weber, comunicando que o Congresso Nacional enviou ao Supremo um ofício informando que tramita no Legislativo um projeto de resolução que visa a ampliar a transparência e estabelecer critérios de proporcionalidade e de impessoalidade na regulamentação das emendas de relator-geral. A relatora, Rosa Weber, afirmou que o projeto demonstra a “abertura do Parlamento ao saudável diálogo institucional”, e disse que a preocupação do Congresso Nacional em ampliar a transparência estabelecendo critérios de impessoalidade e proporcionalidade é “louvável”. No entanto, segundo ela, o projeto não atrapalha o julgamento da ação.

Pela proposta no Congresso Nacional, 15% do valor das emendas caberá a indicações das presidências da Câmara e do Senado (7,5% para cada Casa) e 80% distribuídos proporcionalmente aos partidos. Na nota, Pacheco diz que “as emendas de relator não são impositivas. É dizer, sua execução passa pelo crivo do Poder Executivo, que preservará sua discricionariedade na condução do cumprimento da lei orçamentária”.

Entenda o que é o orçamento secreto
A iniciativa para a criação do orçamento secreto, com as emendas RP9, partiu do Legislativo em 2019 durante a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020. Como costuma relatar, o presidente da República Jair Bolsonaro inicialmente vetou a criação do orçamento secreto. No entanto, quando o texto retornou ao Congresso, não houve votos suficientes para derrubar o veto presidencial.

Porém, a proposta foi ressuscitada no final do mesmo ano pelo então ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência e então ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos (sem partido). Assinado pelo presidente Jair Bolsonaro, o texto seguiu para o Congresso e foi aprovado em votação simbólica, em que não há registro formal dos votos individuais.

A legislação brasileira garante a deputados e senadores emendas para aplicação em áreas como saúde e educação. Emendas são recursos do Orçamento da União direcionados por deputados para suas bases políticas ou estados de origem.

Até 2020, a maioria dos recursos provinha de emendas individuais (RP6), indicadas por cada parlamentar e de caráter impositivo, ou seja, com obrigação de serem executadas. Além delas, existem as emendas coletivas de bancada (RP7) e de comissão (RP8). As de bancada são emendas coletivas, elaboradas por deputados do mesmo estado ou região e também são impositivas. Já as de comissão são emendas coletivas de comissões permanentes da Câmara ou do Senado e não são impositivas.

A nova modalidade de emendas do relator não é impositiva. Ao contrário das emendas tradicionais, não é possível saber o nome do parlamentar que registrou o pedido, tampouco o destino desses recursos,

Os relatores-gerais, sempre um deputado ou um senador, que se revezam na função, já movimentavam recursos no exercício de suas atribuições. Não havia, entretanto, marcação específica para tais emendas. O que mudou foi a atribuição de um identificador e a relação com as demais regras orçamentárias. Foram as emendas de relator que deram origem ao orçamento secreto.

O problema de sua concepção e seu uso está ligado à transparência. Ao contrário das emendas tradicionais, não é possível saber o nome do parlamentar que registrou o pedido, tampouco o destino desses recursos.

FLÁVIA MAIA

Site Footer

Sliding Sidebar

O Fuxiqueiro – Todos os direitos reservados.