1 – Esse centro de João Pessoa, que está se findando, já foi a coqueluche da cidade. Ainda vi, convivi com ele, passeei pelas suas noites e sinto saudades desse tempo. O Ponto de Cem Réis era povoado. Quando a noite batia, abriam-se as portas do Parahyba Palace Hotel para os notívagos frequentadores da sua boate. A pouca luz emprestava ao ambiente um cheiro de pecado. Mas era um pecado bom, com gosto de quero mais.
2 – Quem não podia frequentar a boate do Parahyba se recolhia a lanchonete de Zezinho, ao 2113 de Evilásio de Andrade, aos restaurantes da Lagoa Pietros, Flor da Paraíba e Cassino, antes entrando na 13 de Maio para saborear a Fava do Efraim, tomando uma gelada ou derrubando uma meiota da mais legítima e saborosa Engenho do Meio, aquela fabricada em Santa Rita no engenho de Severino Maroja.
3 – Pecava-se entre as Palmeiras da Lagoa com as irmãs mulatas que davam amor em troca de desmerréis, ou então descia a ladeira a procura das fadas da Praça Pedro Américo, do derredor dos Correios , dos becos escuros da rodoviária.
4 – Sem esquecer o Pavilhão do Chá com seus garçons impecavelmente vestidos, o terno branco e a gravata borboleta adornando a elegância, e as mesas dispostas no seu salão em forma de círculo, onde eram servidos os mais variados quitutes e a cerveja Pilsen Extra da Antarctica exigida pelo jovem Eilzo Matos no fulgor dos seus enxerimentos.
5 – Tinha mais coisas pra se ver e viver. A começar do Luzeirinho no final da Vasco da Gama em Jaguaribe, do Woodstock na esquina da Rodrigues de Aquino em demanda do Mercado Central, do Grande Ponto de Seu João, da Cantina do Camões na pracinha do hoje Sabadinho Bom, do Bar da API e do Bar do Grego.
6 – Roupa boa só quem vendia era a Le Mans de Geraldo Gomes de Lima, calçado só na Cherry de Aristides, jóias só em Jardel, móveis só na Movelaria Pernambucana de Gilda Almeida, quem tocava comprava seus instrumentos no Tamborim de Ouro e remédio bom só quem tinha era a rede de farmácias Padre Zé de Josélio Paulo Neto.
7 – Era chique demais almoçar no restaurante da sede central do Cabo Branco, na Duque de Caxias. O bode com feijão verde era apreciado pelos deputados Ruy Gouveia, Bosco Barreto e Antônio Montenegro, que exigia sempre, antes da comida, uma boa lapada de conhaque Dreher para abrir o apetite.
8 – Nem preciso dizer que isso não mais existe. As putas sumiram com o progresso, os bares foram engolidos pelas novidades da orla marítima, as lojas fecharam para dar lugar aos shoppings e aos lugares chiques da Epitácio, de Tambaú e da estrada de Cabelo e as lanchonetes, mais a fava da 13 de Maio, saíram de moda.
9 – Quem passa, hoje, pelo centro de João Pessoa, vê os prédios, mas se olhar direito também verá as placas de “vende-se” e “aluga-se” anunciando que ali não mora mais ninguém.
10 – Dizem que vão revitalizar o centro histórico. Tomara. Esta semana um comerciante chorou durante depoimento na Câmara Municipal. Disse que está no comércio desde 1975 e corre o risco de fechar suas duas lojas se a batida do bombo não mudar.
11 – E agora lá se vão meus abraços sabadais para Ricardo Lucena, Venancio Medeiros, Lúcio Landim, Sany Japiassu, Eduardo Videres, Paulo Márcio Soares Madruga, Adalberto Targino, Renovato Ferreira, Gilvandro Guedes, Olga Franco, Chico Franca, Marcos Holmes, João Queiroz, Fernandinho Milanez, Assis Camelo, Flávio Lacerda, Raquel Lucena Trindade, Tadeu Guedes, Felipe Silvino, Solon Benevides, Carlos Artur e Paulo Renato Bezerra.
12 – Dona Doquinha, sousense, viúva de Seu Oliveira, resolve conhecer João Pessoa e convida a amiga Maria Rachel, esposa do ex-prefeito de Sousa e ex-governador, Zabilo Gadelha, pra lhe acompanhar na aventura.
Conhecem a Bica, o viaduto, o Ponto de Cem Réis e, finalmente, chegam à praia. Olhando aquele mundão de água, Dona Doquinha, vendedora de leite, exclama para a comadre extasiada.
– Comadre Maria, já pensou se toda essa água fosse leite! Garanto que a gente ia enricar do dia pra noite.
E dona Maria, que também vendia leite em Sousa, não gosta muito da idéia.
– E onde a gente ia arranjar tanta água pra botar nesse leite, comadre?