A SERVIÇO DE QUEM? Walter Santos usa advogado Michel Saliba para confirmar tese sobre inelegibilidade de Ricardo Coutinho e é desmentido

POR FLÁVIO LÚCIO

Tive acesso a um áudio do conceituado advogado Michel Saliba endereçado ao jornalista Walter Santos. No áudio, Saliba reclama que Walter Santo usou suas palavras em uma matéria publicada pelo WSCOM, ontem, com a clara intenção de dar legitimidade jurídica à tese da inelegibilidade de Ricardo Coutinho e, como veremos, não foi nem de longe o que Saliba disse.

Como se fossem ministros do STF, jornalistas paraibanos vivem a repetir há meses, dia sim, outro também, que o ex-governador está inelegível e que não pode ser candidato. É a torcida organizada de Efraim Moraes, que já foi de Aguinaldo Ribeiro antes deste desistir de disputar com Ricardo Coutinho a vaga para o Senado.

Tudo começou com uma ação claramente orquestrada — é impossível imaginar por quem. O jornalista Josival Pereira publicou um texto, ontem, em seu blog, em que defende como um fato consumado a inelegibilidade do ex-governador. O texto de Pereira foi reproduzido pelo site de propriedade de outro jornalista, Gutemberg Cardoso (Polêmica Paraíba), e pelo WSCOM, de propriedade do jornalista Walter Santos.

Walter Santos, por certo, achou insuficiente publicar apenas a opinião — repito, opinião — de Josival Pereira, e buscou dar, digamos, mais lastro, confiabilidade à tese do colega. Santos, então, ligou para Michel Saliba para conversar sobre o caso de Ricardo Coutinho.

O resultado dessa conversa foi uma matéria, assinada por Walter Santos que, como veremos, rebaixa ainda mais o jornalismo paraibano a um patamar ético que faz ruborizar qualquer um que atue e tenha orgulho dessa profissão.

No seu costumeiro estilo ininteligível, o dono do WSCOM coloca palavras na boca de Michel Saliba afirmando que o advogado “entende que a realidade do ex-governador Ricardo Coutinho buscando suspensão dos efeitos de duas decisões do TSE, à unanimidade, tornando-o inelegível em 2019 tende a não ter abrigo do Supremo Tribunal Federal, através da relatora ministra Carmem Lúcia” (sic para todo o trecho!).

Com algum esforço é possível entender o que Walter Santos escreveu: que RC recorreu ao STF de um julgamento do TSE, realizado em 2020 (e não em 2019), às vésperas da eleição de prefeito, e que Carmem Lúcia, a relatora, não deve atender ao que a defesa de Ricardo Coutinho pede. Um jornalista que é incapaz de ser fiel até a datas…

Depois, notem, Saliba é citado. E ele faz questão de usar sempre o termo “em tese” para deixar claro que fala de maneira genérica, como suposição, sem referência a um caso que tenha conhecimento a fundo.

“O pedido da Defesa do ex-governador solicitando a não eficácia das decisões tomadas pelo TSE tende, em tese, a não ter abrigo por parte da ministra Carmem Lúcia”.

Mesmo se referindo ao fato de Saliba não conhecer o processo, Walter Santos achou relevante destacar que o advogado “acha que dificilmente a ministra derrubará as decisões do TSE”.

O último parágrafo do texto é ainda mais problemático porque se trata de uma pura e simples mentira: “Michel Saliba ainda avaliou que a Defesa pode recorrer à 1ª Turma do STF onde estaria a última chance do ex-governador, mesmo assim considera difícil a situação do ex-governador paraibano.”

Como está registrado no áudio, Michel Saliba leu a matéria enquanto tomava café da manhã e teve um susto ao perceber as distorções do que ele havia dito durante a conversa informal, em off, para usar o jargão do jornalismo. Ele lembra, dando o primeiro puxão de orelha no jornalista, que “não estava tendo aquela conversa como entrevista, estava em off”. Todo bom jornalista sabe distingui uma coisa da outra, não?

No áudio, Saliba mantem o que disse sobre a ministra Carmem Lúcia de que existe a tendência de que ela, sozinha, não conceda uma “liminar em tutela cautelar”, mas que isso valeria não só para o caso de Ricardo Coutinho, mas para qualquer outro. Não se trata, portanto, de um julgamento a respeito do mérito, mas de procedimento da ministra, que, supõe-se, deve remeter a questão ao julgamento da Primeira Turma do STF e não tomar a decisão sozinha. Foi exatamente nesse ponto que Walter Santos resolveu mentir a respeito da opinião de Michel Saliba, não apenas distorcendo, mas dando a ela um sentido completamente distinto:

“Agora, eu disse também que, no mérito, o ex-governador tem chance na Primeira Turma de fazer uma maioria pela matéria. Eu não conheço os autos, mas conheço o posicionamento dos ministros da Primeira Turma sobre Direito Eleitoral, Direito Penal. Então, nesse ponto, inclusive, eu realcei exatamente isso, que eu vejo chance [de vitória de Ricardo Coutinho] em decisão colegiada.”

Expostos os detalhes da conversa, Saliba passa a protestar contra a manchete que Walter Santos resolveu dar à matéria. Apesar da insistência do advogado de dizer que não leu os autos, como a própria matéria registra, o WSCOM diz o oposto na manchete: “autos apontam indicativo do STF de manter inelegibilidade de RC”.

Saliba então fez um pedido difícil de ser cumprido. Ele pede “em nome do bom jornalismo” que Walter Santos “retificasse essa situação”, caso contrário, ele falaria “para todos os órgãos de comunicação da Paraíba exatamente o contrário do que você publicou, e eu não gostaria [de fazer isso].”

O áudio foi enviado a Walter Santos pela manhã. Até agora, o máximo que o jornalista fez foi esconder a matéria no site, o que não impede de ser acessada via link enviado, por exemplo, pelo Whatsapp. Nenhuma retificação, nenhum pedido de desculpas a Saliba e a seus leitores. Sem surpresas.

Não imagino que esse episódio possa dar um freio em atitudes como essa, que enfeiam ainda mais nosso jornalismo, afetando a credibilidade daqueles que se esforçam por levar a sério o código de ética da profissão. Mas, vamos continuar aqui, pronto para denunciar essas iniquidades que tentam se travestir de jornalismo.

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