Governos de pelo menos 93 países já confirmaram nas redes sociais ou em telegramas oficiais a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva, nas eleições brasileiras no fim de semana. O número, segundo o UOL apurou, irá aumentar ainda mais ao longo desta terça-feira, com dezenas de autoridades buscando formas de falar com o vencedor do pleito.
A avalanche de reconhecimentos foi recebida no Itamaraty como um sinal claro de que, para a comunidade internacional, não existem questionamentos sobre a eleição e que, a partir de agora, o interlocutor é Lula, e não Bolsonaro.
Se as principais democracias do mundo e alguns dos principais rivais de Bolsonaro se apressaram para reconhecer a derrota do presidente de extrema direita, o que surpreendeu a ala mais próxima ao movimento ultraconservador foi o comportamento de aliados internacionais de Bolsonaro.
Giorgia Meloni, primeira-ministra da Itália, foi às redes sociais para felicitar Lula. Ela acaba de vencer suas eleições na Itália e, pela primeira vez em décadas, o movimento herdeiro do fascismo tomou o poder em Roma.
Em sua vitória, Meloni recebeu efusivas mensagens do clã Bolsonaro, numa esperança de que a nova aliada fizesse o mesmo no Brasil. Mas isso não ocorreu e a italiana fez votos de que Lula e ela continuem a trabalhar juntos em nome da “histórica amizade” entre os dois povos.
Quem também reconheceu o resultado das urnas foi a Arábia Saudita, onde Bolsonaro chegou a dizer que tinha afinidades com o príncipe herdeiro, Mohamed Bin Salman. Nas redes sociais, o saudita desejou “sucesso” ao petista.
O governo dos Emirados Árabes Unidos, também com amplos contatos com a família do presidente, já parabenizou Lula.
Mais moderada foi a ultraconservadora Katalin Novak, presidente da Hungria e que há poucos meses esteve no Brasil. Ela não citou o nome de Lula nas redes sociais. Mas deixou claro que Budapeste reconhece a vitória do petista e que deseja sucesso ao “presidente eleito”. Ao longo dos anos, a Hungria foi o exemplo que o bolsonarismo adotou para silenciar a imprensa, a sociedade civil, controlar os demais poderes e desmontar a democracia.
Em Israel, nem mesmo o gesto de Bolsonaro de apontar para um reconhecimento de Jerusalém como capital e a mudança de votos do Brasil na ONU em favor dos israelenses levou o governo do país estrangeiro a hesitar sobre a eleição brasileira. Durante o dia da eleição, a primeira-dama Michelle Bolsonaro foi votar com uma camisa na qual a bandeira de Israel estava estampada, uma sinalização principalmente ao movimento evangélico brasileiro.
Mas, nas redes sociais, Isaac Herzog parabenizou Lula. “Recordamos com carinho sua visita a Israel diante seu mandato anterior”, disse. “Esperamos aprofundar nossos excelentes laços e principalmente cooperar em um assunto que tanto nos preocupa: o meio ambiente”,
Na Polônia, também governada pelos ultraconservadores, as autoridades não hesitaram em saudar a vitória de Lula.
Na América do Sul, o reconhecimento do Suriname nas últimos horas completou o mapa da região, com todos os vizinhos do Brasil chancelando o sistema eleitoral do país. Todos os países dos Brics também sinalizaram na mesma direção.
O reconhecimento amplo não ocorreu por acaso. Depois de semanas de uma coordenação detalhada, democracias Ocidentais se apressaram para parabenizar Luiz Inácio Lula da Silva pela vitória, com telegramas e mensagens nas redes sociais ainda na noite de domingo. A meta era de criar um cordão sanitário que impedisse Jair Bolsonaro de repetir a estratégia de Donald Trump e questionar a lisura da eleição. Outro temor era de que o cenário de caos da Bolívia fosse repetido,
Ao parabenizar Lula, o que Biden, Emmanuel Macron, Olaf Scholz e tantos outros fizeram foi sinalizar que confiavam no processo eleitoral e nos resultados das urnas eletrônicas. Mas há um segundo recado: a partir de agora, reconhecem que o poder legítimo no Brasil está com Lula.
Entidades internacionais também se expressaram, como a Organização dos Estados Americanos, ONU e a União Europeia.
O processo de isolamento de Bolsonaro foi completado nesta segunda-feira quando os maiores aliados do Brasil fora do Ocidente – China e Rússia – deixaram claro que querem estabelecer parcerias amplas com Lula.
Em menos de 24 horas, portanto, uma espécie de cordão sanitário foi estabelecido, enquanto assessores de Lula indicam que a busca pelo presidente eleito por parte de governos e entidades internacionais explodiu.
Um exemplo é a Conferência do Clima da ONU, no Egito. O UOL apurou que delegações estrangeiras estão enviando negociadores extras para que tenham como incumbência buscar a equipe de transição do Brasil para iniciar a negociação de novos entendimentos.
A fila para falar com o Brasil de Lula, segundo diplomatas, já preenche uma ampla agenda.
Entre os europeus, havia ainda a esperança de que Bolsonaro permitisse que uma equipe de transição ou até mesmo Lula fosse para a cúpula do G-20, que ocorre em novembro na Indonésia. Mas, dentro do Itamaraty, a possibilidade é vista como “impossível”.
No G-20, porém, diplomatas brasileiros já admitem que, se Bolsonaro for, será difícil organizar qualquer tipo de encontro para o presidente derrotado. Principalmente se mantiver a postura de não reconhecer a derrota e iniciar um processo de transição.
Jamil Chade
Colunista do UOL