EDMILSON LUCENA
Nos enerva, e dá nojo, saber que políticos, ao deixarem o cargo, requerem aposentadoria vitalícia. Uma bagatela de, no mínimo, a preço de hoje, mais de 30 mil/mês, no caso dos deputados estaduais, se a aposentadoria for integral, podendo acumular muito mais, tantas são as alicantinas perpetradas. É o exemplo que deixam para os assalariados e miseráveis. É muito difícil imaginar um país com rabo. Mas, quando se fala de Brasil, tudo é possível, até dispensando metáfora. Se tem rabo, tem selvageria no meio. Se tem cauda pode-se ter duas opções: ou esconder, por vergonha; ou escancará-la por safadeza. E o rabo podre do Brasil é muito maior do que o tolerável e o ocultável.
Esta semana, numa tarde movimentada, precisei ir a um hospital para fazer uns exames e, lá, percebi com tristeza que havia um paciente, trazido pela mulher e pelo cunhado. Olhar e postura de deficiente visual grave. Uma pessoa simplória, sofrida e que responde, com exatidão, por amostragem de imenso percentual de brasileiros. Trinta e tantos anos de serviço pesado, no meio rural; esquálido, semi-analfabeto, rosto vincado pelas chicotadas da má alimentação, péssima higiene e tristeza por participar de tantas tristezas. Aposentadoria: salário mínimo. Doença: grave diabetes, enferrujando e sangrando dentro dos olhos. Angústia irreprimível: a certeza lancinante da cegueira iminente.
Como seria interessante, e patriótico, todos os partidos políticos palparem a impotência e a resignação deste senhor nas filas enormes e lentas dos serviços públicos de saúde! Pois que não passa de mais um coitado na lista de espera para uma cirurgia aliviadora nos olhos. Chora e cora pela condição de miserável aposentado, impedido de entrar no mundo fantástico e quase miraculoso da assistência médica diferenciada dos grandes serviços particulares.
No dia seguinte, acompanhando o noticiário, vejo uma notícia bem brasileira: a lista dos marajás aposentados na mamata pública, envergonhando todo o país. Salariozinhos da ordem de 15.000 a 30.000 reais. Gente graúda, bem nutrida, dentes bem cuidados, pele boa, viajados, queimados de praias, possuidores de boas mansões.
Pelo demérito do prêmio e acuados pela indecência cívica, até ligam para os jornais, pedindo silêncio sobre suas vidas e seus contracheques. Tramam, e conspiram, processar a imprensa pela indelicadeza de mostrar a fartura e a usura em seu viver. Têm muitos que nem gostam de receber parentes pobres e amigos de outras épocas.
E, para amplo tédio/descrença dos que cutucam no assunto, até hoje não tivemos nenhuma autoridade/poder que tivesse o topete (e rubor facial) para abrir a caixa-preta destes subterrâneos da cidadania. E a conta vai crescendo; e nós, contribuintes, vamos pagando. Tirando dos miseráveis e trabalhadores para engordar esta fauna insaciável e pantagruélica.