A instituição portuguesa aproveitou a suspeição levantada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal para interromper a sequência de prejuízos com o lançamento de jogos e loterias em parceira com o banco brasiliense
Lisboa — A decisão da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa de romper um contrato com o Banco de Brasília (BRB), para o lançamento de jogos e loterias no Distrito Federal, teve como principal objetivo conter o rombo com o possível negócio. Pelo que havia sido negociado, a Santa Casa, que tem parte de seu capital oriundo de doações, já tinha enfiado cerca de 5 milhões de euros (R$ 27,5 milhões) na parceria e, depois de efetivada a operação, ainda teria de repassar mais 14 milhões de euros (R$ 77 milhões) à instituição financeira.
Ao tomar conhecimento desse volume tão grande de desembolso, a atual presidente da Santa Casa, Ana Jorge, ordenou que se pusesse um freio nesse escoadouro de dinheiro. A entidade, que controla o sistema de loterias de Portugal, aproveitou a decisão do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) de parar, por uma série de suspeitas, as negociações conduzidas pelo BRB até que tudo fosse avaliado, para enterrar de vez o negócio, que estava ficando caro demais e sem nenhuma perspectiva positiva de retorno.
O acordo entre o Banco de Brasília e a Santa Casa foi fechado em abril deste ano. Um mês depois, o TCDF pediu informações sobre o negócio. O processo corre em sigilo. À época, foi criada a BRB Loterias, que tinha o BRB com 50,1% das ações, ou seja, era o sócio majoritário, e a Santa Casa Global, com 49,9%, que é controlada pela Santa Casa Portugal. Esse emaranhado de empresas, por sinal — são mais de uma dezena de participações acionárias cruzadas, além de sócios pessoas físicas —, seria uma forma de dificultar a fiscalização e facilitar desvios.
A parceria entre o BRB e a Santa Casa de Lisboa ocorreu no fim do mandato de Edmundo Martinho à frente da instituição beneficente. Ele tem garantido que tudo foi feito de forma muito transparente e dentro da lei. A sucessora dele, no entanto, tão logo tomou posse, contratou uma consultoria internacional, a BDO, para auditar as ramificações dos negócios da Santa Casa para fora de Portugal, sobretudo no Brasil, conforme revelou o jornal Público. De início, as operações internacionais, que ficam debaixo da estrutura da Santa Casa Global, deveriam custar 5 milhões de euros (R$ 27,5 milhões), mas já foram consumidos 27 milhões de euros (R$ 148,5 milhões), ou seja, mais do que o triplo do previsto inicialmente.
Procurado pelo Correio, pela jornalista Ana Maria Campos, o BRB afirmou que “conduziu processo competitivo visando à seleção de parceiro internacional para o desenvolvimento e a implantação das loterias do Distrito Federal”. E acrescentou: “O processo de seleção resultou na escolha da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa, cuja validade do contrato está vinculada à aprovação pelos órgãos competentes de controle e supervisão. Diante da não obtenção das mencionadas autorizações nos prazos contratuais, BRB e SCML se encontram em fase de negociação com vistas a uma solução adequada para a parceria”. A Santa Casa de Misericórdia de Lisboa não respondeu aos pedidos de explicações