Marco temporal: a histórica vitória dos indígenas no Supremo

Por 9 x 2, Corte derruba tese segundo a qual os povos originários só poderiam reivindicar terras que ocupavam em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição


Indígenas choram após a vitória: tese estabelecia que a população originária só poderia reivindicar as terras que estivesse ocupando em 1988 – (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

Marina Dantas – Os povos indígenas conseguiram, nesta quinta-feira, uma vitória marcante na luta pelo direito à terra. Com o placar de 9 a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a tese do marco temporal, segundo a qual a população originária só pode ter demarcados os territórios que ocupavam na promulgação da Constituição, em 1988.

O triunfo no STF, porém, não deve encerrar o assunto, pois tramita no Congresso um projeto de lei favorável ao marco temporal. A votação do texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado está marcada para a semana que vem. Se aprovado, vai a plenário.

Mesmo que vire lei, porém, não tem força para colocar em dúvida a validade da decisão do STF, mas tem potencial suficiente para criar mal-estar entre os dois Poderes. Após o julgamento, por sinal, parlamentares dispararam críticas à Corte.

A decisão do STF foi comemorada por indígenas e entidades de proteção. Eles acompanharam a votação no plenário e do lado de fora do prédio, por meio de um telão.

Na apreciação feita pelo Supremo, apenas os ministros André Mendonça e Kassio Nunes Marques votaram a favor do marco temporal.

A maioria contra o marco temporal foi formada com o voto do ministro Luiz Fux. Segundo ele, “ainda que não tenham sido demarcadas, terras ocupadas devem ter a proteção do Estado, porque elas têm a proteção constitucional”.

Na próxima semana, os magistrados vão definir as regras que serão aplicadas ao caso. Uma das alternativas é definir que a União indenizará pessoas que morem em áreas indígenas a serem demarcadas, mas que as tenham ocupado de boa-fé.

Outra opção é indenizar apenas por benfeitorias que tenham sido feitas nos locais. No entanto, a depender da amplitude das indenizações, a demarcação de terras para uso dos povos tradicionais pode ficar travada por falta de previsão orçamentária.

Violências
A questão é polêmica porque envolve o direito à moradia de comunidades que historicamente sofreram com violências, expulsões de áreas ocupadas, genocídios e deterioração cultural desde a chegada dos portugueses ao Brasil, em 1500.

O coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Dinaman Tuxá, enfatizou a importância da decisão. “Neste momento, estamos realizados e saímos daqui com uma certeza: continuaremos a lutar para termos nossos territórios demarcados”, ressaltou.

Ele frisou que o marco temporal foi derrubado, mas não significa que a batalha acabou. “Temos de concretizar a política de demarcação no Brasil, que está prevista no texto constitucional e que garante esse direito aos povos indígenas”, afirmou. “Agora, não há de se discutir marco temporal, e, sim, demarcar os territórios indígenas.

A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), destacou, em nota: “Há séculos, estamos vivenciando inúmeras reconfigurações dos mecanismos de violência empreendidos contra nossas vidas e contra nossos territórios, e qualquer fragilização dos nossos direitos territoriais constitucionais estimula ainda mais invasões e violações”.

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